Recentes decisões administrativas do governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), conseguiram o que muitos imaginariam quase impossível. O pagamento parcelado dos salários dos trabalhadores públicos, anunciado na última sexta-feira e colocado em prática desde ontem, dia 3, conseguiu reunir numa mesma frente desde militantes e dirigentes de correntes consideradas de extrema esquerda a oficiais e praças da Brigada Militar – a polícia do estado.

Outras sinalizações, como uma reforma da previdência dos servidores e a venda de patrimônio público para fazer caixa, colocaram os sindicatos dos servidores e as associações dos militares em estado de alerta. Todos prometem uma assembleia unificada no próximo dia 18, que pode decidir por uma greve de duração indeterminada.

A julgar por ontem, a luta que se inicia promete. Várias cidades gaúchas pararam. A ausência da polícia nas ruas levou bancos e comércio a fechar as portas durante todo o dia, inclusive na capital. Servidores fizeram manifestações de rua e atos políticos para denunciar e debater com a população os planos do governador.

Luta contra ajuste fiscal

A CUT Rio Grande do Sul, que compõe a coordenação unificada dos servidores públicos, tem participado de debates e encontros sindicais em todo o estado, para organizar a assembleia do próximo dia 18. Prepara jornal impresso para atacar aquilo que define como ajuste fiscal, que vai desacelerar ainda mais a economia gaúcha e restringir serviços públicos.

A questão econômica e a prioridade nos pagamentos é uma escolha política, lembra o dirigente executivo da Central Marcelo Carlini. "O governador decidiu parcelar salários dos servidores em três vezes. Ora, toda a folha de salários do funcionalismo soma R$ 1,2 bilhão por mês. E só em isenções fiscais, ano passado, o estado perdeu R$ 15 bilhões”, argumenta o líder sindical, que é educador da rede pública.

Carlini conta que o governador prepara uma série de medidas para reduzir políticas públicas e privatizar o que restou dos ativos estaduais, caso do Banrisul. Sartori anunciou o parcelamento dos salários dos servidores – menos os do Judiciário e do Legislativo – na última sexta-feira, via Youtube, e logo depois viajou para Curitiba.

Segundo Carlini, os dias que se seguiram foram de medo na população, por conta da decisão anunciada de os policiais não trabalharem na segunda-feira seguinte, e de perplexidade geral. A mensagem que ficou no ar é a de que o estado está quebrado. "Ausentando-se de cena, o governador deixou que os jornais e emissoras, com a RBS à frente, ficassem dias martelando a ideia de que é preciso privatizar para resolver o problema”, narra Carlini.

Mau exemplo federal
A tarefa dos movimentos sindical e sociais, agora, é se contrapor a essa ideia de ajuste. "A população ainda não comprou esse discurso. As mobilizações de ontem aconteceram no Estado inteiro. Mostraram que temos base social e que existe outra política possível”, diz o dirigente da CUT-RS.

Em resolução publicada ontem, a CUT estadual pede aos partidos populares que se juntem a essa luta. "Só oposição parlamentar não nos basta. Precisamos dos partidos na rua, comprometidos”, diz Carlini. Isso exigirá, na avaliação do sindicalista, criticar e se opor ao ajuste fiscal também encaminhado pela presidenta Dilma, que acabou funcionando como exemplo para governadores e prefeitos usarem o discurso da crise e da explosão das contas públicas para implementar pautas conservadoras.

O estado de coisas no Rio Grande exige também críticas à gestão passada, de Tarso Genro. Segundo Carlini, embora o ex-governador petista não tenha criado a política de isenções fiscais, que equivalem à metade do orçamento estadual, nada fez para mudá-la. Outro elemento da crise é a falta de renegociação da dívida com a União, tentada por Genro, mas nunca concluída.

Aulas de cidadania
O CPERS, sindicato que reúne os educadores estaduais, recomenda que de hoje até o próximo dia 17 seus filiados reduzam o tempo dedicado às aulas tradicionais e reservem esse espaço para debater com os alunos a real situação do Rio Grande do Sul e os motivos que levam os servidores e realizar mobilizações como as de ontem.

Suruagy
Em 1997, o então governador de Alagoas Divaldo Suruagy foi obrigado a renunciar diante de mobilizações que reuniram sem terra, professores, policiais militares e diversas outras categorias. A origem da crise foi a acordo feito com usineiros pelo seu antecessor Fernando Collor, que prometera aos proprietários de usinas a devolução de uma soma que não era, de fato, dívida do estado.

Sem dinheiro, Suruagy chegou a deixar os servidores sem salários por seis meses.

Fonte: CUT
 


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